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24/11/2006 O MODELO DAS CAIXAS MUTUALISTAS: OPORTUNIDADE PERDIDA PARA PORTUGAL?

O Semanário SOL publicou um texto em que Eduardo Catroga se referia às Caixas Mutualistas Espanholas como uma ameaça á nossa economia. Referia-se nessa reportagem que: as Caixas Mutualistas são associações, e portanto não podem ser alvo de OPA’s; as Caixas dominam 50% do mercado bancário espanhol – que tem a dinâmica que sabemos; e que apesar de não poderem ser compradas podem comprar e compram outros bancos. Daqui se intuindo que havia um perigo de concorrência desleal ou de diferentes regras do jogo, que favoreciam o sistema espanhol em detrimento do português.

 

Parece-me sem dúvida um tema do máximo interesse. As Caixas regionais em Espanha, seja na Catalunha, Madrid, Galiza e por todas as regiões têm um peso tremendo. No sistema financeiro de Espanha e também no sistema financeiro português, onde um dos decisores da OPA BCP/BPI será La Caixa da Catalunha. Onde quase todas as Caixas já estão representadas e tem um número significativo de balcões. Onde, pasme-se, a sua estratégia não passa pela captação de depósitos e poupanças, mas pela concessão de crédito em especial ao investimento e naturalmente dando ênfase ao ligado a empresas com negócios transfronteiriços.
 
Vendo por exemplo o caso de uma das menores Caixas, a CaixaNova, que engloba Vigo, Pontevedra e Ourense, tem apenas a seguinte estratégia em Portugal: instalou escritórios que só fazem crédito ao investimento; tem vindo de forma sistemática a comprar empresas produtivas, como por exemplo as pelo menos três grandes compras de marcas e quintas de vinho do Porto que fez a Américo Amorim; comprou 5% da Media Capital; investiu pelo menos num grande fundo de capital de risco português; está a instalar no Porto uma “business school”. Tudo isto é normal ou razoável para uma Caixa sedeada numa região similar em área e habitantes ao Minho? Toda esta estratégia (não) tem fortes implicações na dinamização do investimento, do comércio e das externalidades (lembra-se do que aconteceu á business school do BPA/BCP?). Tem e ninguém no Minho, no norte e ou em Portugal devia negligenciar o modelo, mas antes aprender com ele e fomentá-lo deste lado.
Aliás o que o norte de Portugal necessita mesmo é de aprender com a Galiza. E aprender é copiar o que está bem, fomentar e fazer. Dinheiro não falta, aliás é a região que mais receberá no QREN. Mas ao norte se falta estratégia, também falta e muito, liderança. Nem aliás podemos, mas devíamos, comparar o peso da Comissão de Coordenação Regional Norte e das suas Presidências com as da Xunta da Galicia. Claro está que quando há oportunidades conjuntas, fundos intraregionais, e mesmo um fundo de capital de risco norte de Portugal – Galiza, quem as aproveita e comanda são os Galegos. Mais por demissão nossa que por imposição deles.
 
Ora sendo esta uma das Caixas mais pequenas, daqui se vê o peso e o protagonismo que já vai tendo em Portugal. E á questão inicial de estará isso certo ou errado, ou seja, é uma ameaça ou uma oportunidade, eu tenho que discordar dos pressupostos da análise SOL/Catroga.
O que em Espanha e nas suas regiões e vai fazendo e bem, é fortalecer poderes naturalmente blindados de decisão, poderes que no caso financeiro têm um enorme cruzamento com os investidores regionais com as empresas aí sedeadas. Não foram as Caixas espanholas que estiveram mal. Fomos nós em Portugal, que à custa do modelo de concentração bancária, das economias de escala – “peso internacional”, de falta de incentivo ao mutualismo e ao associativismo na área financeira, perdemos um forte trunfo no fomento económico e na manutenção dos centros de decisão. Agora se esta OPA der certo, existe seguramente quem do outro lado espreite e se não der, também.
As autonomias espanholas criaram centros de poder e desenvolvimento económico que puxaram a economia para cima. A convergência entre poderes empresariais, políticos e financeiros regionais, construiu tecidos económicos regionais sólidos.
Poder político regional e metade da banca sedeada nas regiões e de cariz associativo, explicam por exemplo que a pobre Galiza dos emigrantes para Lisboa, se tenha tornado na pátria da Zara, onde o português é mais inteligível que o Castelhano. E o exemplo dos hoje grupos Inditex, Seur, Halcon, entre outros, mostra como a PYME’s, ou sejam as pequenas e médias empresas de Espanha e das suas regiões, se tornaram grupos económicos fortes e internacionais durante este período.
 
Havendo portanto a tendência em Lisboa, para focar numa Telefónica ou numa Dragados a pujança económica de Espanha, convém perceber que o sucesso de Espanha está baseado no crescimento competitivo de PMEs regionais, que se tornaram grupos internacionais. E que o fizeram não sem grande apoio de poderes políticos regionais autónomos e eleitos, bem como de cumplicidade intensa entre Caixas Regionais de Crédito e empresas sedeadas nas regiões.
 
Entendo pois o modelo das Caixas como uma oportunidade que Portugal já devia ter explorado e incentivado. Entendo mesmo que as Caixas pelo seu carácter regional e pelo sua atitude pró-investimento, como uma oportunidade inter-regional entre a região Portugal e cada uma das autonomias espanholas. Os desafios empresariais na economia fazem-se de transformar ameaças em oportunidades. É o caso. E nem apenas o caso de Espanha, pois o modelo existe em França, em Itália, na Alemanha. Nós é que teimamos em ver ameaças onde devíamos ver oportunidades. Porque será?
 
Artigo de opinião publicado no Semanário Económico – 24 de Novembro de 2006
Joaquim Rocha da Cunha

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