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02/03/2007 O TRIUNFO DOS INDIGENTES

O país vive em suspenso. Enquanto os outros crescem e são positivos, em Portugal as notícias são sempre as mesmas. Más. Será a realidade? Serão apenas as notícias? Ou haverá por cá uma conflituosidade latente e que não leva a lado nenhum? Acho que é esta última que é verdade, nem os jornalistas nem a realidade são tão negativos.

 

Explico. Após mais uma deslocação internacional de uma semana, durante a qual ia vendo, através dos sites, o que se passava, quando cheguei trazia um optimismo – bom para mim e potencialmente bom para Portugal – que quase se desvaneceu.
 
Se no Carnaval, enquanto eu tinha reuniões, o “Rei” Alberto João preparava a demissão, isso poderia ser entendido como um conflito retórico ou apenas como prenúncio de reflexão pascal. Mas, logo a seguir, veio mais “porcaria espalhada pela ventoinha”, em que se tornou uma boa parte da informação que prende o país. Já não é apenas o insuportável fardo dos abusos de crianças ou do “apito dourado”. Agora, na moda mesmo está criar factos artificialmente, colocá-los nos media e conseguir alarido e desviar as atenções ou para virar os holofotes para si mesmo. Há por aí muito indigente que só quer os seus cinco segundos de fama...
 
Na moda, está mesmo fazer processos de intenções cozinhados em gabinetes, sem contraditório real ou pelo menos formal. E colocar cá fora, nos media, o que devoristas querem anunciar. E o povo inculto digere mal, transformando-se numa elipse o vilão em vítima e o herói em criminoso. O bom exemplo disto é o triste espectáculo de Lisboa, onde circulam relatórios apócrifos sem direito a contraditório. E se julgam nos media a “realidade” que da autarquia se quer lançar e, em especial da última vítima, inexpectável mas que já foi atingida na sua honra, vereadora do CDS, Maria José Nogueira Pinto, por um processo que o comunista Ruben de Carvalho caracterizou tão bem como “exemplarmente mau sinal”. Mas é um triste sinal dum país em que é mau criar, há inveja de quem cria, em que é perigoso ter actividade, acção e independência. Ao contrário do discurso oficial, é perigoso senão proibido ser empreendedor.
 
Continua a ser mais fácil ser funcionário público. Muitos ganham bem mais do que o Primeiro-Ministro, mas pior, muitos nem sequer vão ao seu serviço – mas recebem no final do mês. E muitos há que podem causar elevado dano. Nomeadamente, pelo que não fazem em tempo útil. Muitos não são eleitos e portanto não estão expostos. Esta crítica não é feita à classe política. Até penso que o Governo e o seu “Simplex” mostram a determinação que se reconhece no primeiro-ministro. Mas existe uma máquina instalada, que não conquistou o poder na rua em 73 ou 75 e, agora nas redes de bastidores, recria uma internacional solidária, não apenas para “lixar” o capital, mas para capitalizar para amigos ou para outros fins.
 
É uma rede num país em que tudo é permitido ao Estado. Em que o Estado pode ficar a dever a privados, mas o seu contrário dá crime e penhoras. Em que muitos dos dirigentes têm duas bitolas de pensamento, uma aplicável ao Estado em que tudo é normal, justificável com falta de meios e outra aplicada aos privados, que todas as regras existem para serem cumpridas. E sem prejuízo de que a maioria seja naturalmente cumpridora com o seu dever, existe hoje uma milícia instalada na Administração que se move por interesses pessoais, de grupo, ideológicos do antigamente e inconfessáveis para qualquer bem público, mas que decidem, desfazem e destroem qualquer energia positiva que os provados queiram acrescentar ao movimento “Simplex”.
 
O povo, aliás dado a uma inveja crónica e tão hereditária como a falta de instrução, habituou-se à novela da caça aos bandidos, sendo que os bandidos actuais são invariavelmente contribuintes (mesmo que os Estado lhes deva), ou actores públicos privados que ousam ter opinião, agem e portanto se expõem.
 
O paradigma do bom cidadão é o daqueles que permitiram que a Ponte de Entre-os-Rios caísse: são aqueles que nada fazem e portanto não correm riscos. Parece que morreram mais de 50 pessoas. Mas as culpas foram não da indecisão, do desleixo, da negligência, mas dos próprios e das “causas naturais”. Por isso, o país não muda enquanto muito espantalhos, bem pagos por todos nós, não deixarem de criar constrangimentos para os privados com bloqueios, interpretações pessoais e invejas.
 
Não acredito que o primeiro-ministro ou o Presidente, políticos de acção, queiram este país, em que não se procuram soluções, mas se fomentam ou inventam conflitos. Mas é essa conflitualidade, levada ao mais alto nível administrativo, que inibe a criação do emprego e o investimento. Ser hoje empreendedor ou empresário, numa sociedade endividada e consumista, é ser alvo fácil da inveja, da intriga e de poderes ocultos. Independentemente dos méritos, dos resultados, o país continua a basear-se no escrutínio erróneo de processos (de intenções). Por isso não se espantem porque cresce a Espanha, a Roménia e outros onde caem as taxas de IRC e se fomenta o investimento. É que continuarmos a ser o país do orgulhosamente sós dos pobrezinhos, mas remediados, agora mais remediados pela injecção de dívida e consumo, não nos levou nem leva a lado nenhum.
 
Façamos apenas e só uma análise: porque será que os outros países que beneficiaram de fundos comunitários progrediram mais? Porque tiveram mais ênfase em processos ou em resultados? Porque tudo aquilo que se vedava aos privados era permitido aos públicos?
É por estas e outras idiossincrasias, do acreditar mais nos privados e de focar tudo nos resultados, que a Irlanda, com muito menos funcionários pagos a peso de ouro e  a “supervisionarem”, deu um enorme salto na qualificação. E será que há quem saiba mais que os irlandeses sobre crescimento baseado na qualificação?
 
Há, em Lisboa, resmas de entendidos pagos por todos nós para fazer o juízo colectivo entre o bem e o mal, não numa vertente católica, mas noutra religião: a dos despojos do marxismo-maoísmo, que não foi ao poder nas urnas, mas entretanto ganhou legitimidade nos corredores.
 
Artigo publicado no Semanário Económico em 02 de Março de 2007