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16/03/2007 OS CARBONÁRIOS, AS RAPARIGUINHAS DO SHOPPING E OS BURLÕES

Vivemos uma interessante fase da terceira República. Progridem espécies novas ou renovadas, que fazem com que o país continue estagnado. E passadas as promessas de reformas a sério na função pública, vamos continuar com o défice, os impostos, a burocracia e sem espaço para as empresas respirarem.

 

O espaço está melhor para uma cena tipo primeira República e para um estilo queiroziano ou camiliano. Reler a “Queda de um Anjo” de Camilo Castelo Branco ou as “farpas” de Eça de Queiróz, passados quase 150 anos, é parecer ver o presente deste país.
 
A coisa está mesmo para o chico-espertismo ou para o incumprimento dos bons agentes. Há cerca de dois anos, no famoso artigo da má moeda, Cavaco explicava que no estado actual da política, a má moeda podia expulsar a boa moeda. Ora, aplicando isto à economia, e à sociedade, é o que verificamos. Tirando as grandes empresas, as multinacionais e o Estado, a economia está depauperada, e as PME, que garantem o emprego, estão entregues à sua sorte. E a sorte delas é a burocracia, o excesso de zelo da Administração, os impostos, os regulamentos, a concorrência feroz, a ausência de financiamento.
 
Ora, com os constrangimentos citados e sem uma política para as PME, o que temos é um país em que grandes construtores e banca vivem bem – viverão melhor ainda com mais grandes obras públicas – e o restante país que não só paga uma função pública excedentária, como paga as rendas dessas infra-estruturas.
 
E, nessa pressão, é que a boa moeda, ou seja os bons agentes económicos, cumpridores, poupados, investidores, podem perder o passo para a má moeda, isto é, para as empresas incumpridoras, o Estado, os consumidores que se endividaram até aos 100 anos.
Este fenómeno tem, aliás, associado a si uma sociedade mediática, em que se destroem carácteres e pessoas pela mais pequena impressão. Não admira que alguns media estejam para fechar. A “estória” do Pedro e o Lobo já cansou os mais fiéis leitores. As pessoas saturaram de tanto dinamite no local errado.
 
E é nesta sociedade em que vivemos. Uma sociedade, em que os carbonários trocaram as bombas pela pena pesada da imprensa. Uma vida de bairro, em que as rapariguinhas do shopping querem ganhar mais do que o patrão. Uma economia em que o chico-esperto manipula meio mundo, gente que no fundo quer ser burlada, à espera do “euromilhões” que probabilisticamente não terá.
 
Como se sabe os carbonários de hoje são os mesmos da primeira República: aqueles que não contentes por matarem o rei, foram matando toda a gente, até que mataram a própria primeira República e conduziram ao Estado Novo: as suas réplicas andam por aí espalhadas na comunicação social, quais juízes supremos que tudo e todos julgam.
 
As rapariguinhas do shopping são um fenómeno da adesão à CEE, quando depois dos hipermercados e os carros, as pessoas descobriram que podem gastar o que têm, o que a família e os amigos têm, na inveja do que quem produz, mantém.
 
Os burlões sempre existiram e se no passado vendiam notas do banco de Inglaterra, agora vendem constituição de empresas e prometem mundos e fundos perdidos com crédito ao consumo.
 
Agora imaginem que estas três figuras de estilo, cada vez mais correntes e ufanas da sua verdade compulsiva, se encontram por um acaso numa esquina, e decidem conspirar contra um cidadão ou uma empresa. Porque faz, porque tem resultados, porque é exemplo?
E é nessas alturas, que na sociedade e no país em que vivemos, a boa moeda está ser expulsa pela má moeda. Não sei se isto nos leva a outro Novo Estado, mas que não é bom o caminho, lá isso não é.
  
P.S. Mais uma vez em Espanha, como orador numa conferência internacional sobre PME, pude constatar a enorme dinâmica e convergência daquela potência económica. Dizem-me de lá, empresários, dirigentes e sindicalistas, que há 30 anos, fizeram os Pactos da Moncloa, e que neles acordaram em apenas repartir o que fosse criado, não como cá exigirem-se todos os direitos adquiridos e pagos pelos contribuintes. A dividi-los por lá, só mesmo a ETA e as autonomias, tudo o resto é confiança. É crescimento. E estão a absorver muita da nossa boa moeda.
 
Artigo Publicado no Semanário Económico de 16 de Março de 2006